sexta-feira, 25 de julho de 2008

Programa para conservação da Mata Atlântica destina R$ 535 mil a reservas particulares

O Programa de Incentivo às Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN) da Mata Atlântica, coordenado pela Aliança para a Conservação da Mata Atlântica (uma parceria entre as ONGs Fundação SOS Mata Atlântica e Conservação Internacional) e a The Nature Conservancy (TNC), apresentou o resultado do seu VI Edital, que destinará R$ 535 mil a 39 projetos selecionados: 23 de criação individual de reservas, seis em conjunto e 10 de elaboração de plano de manejo.

“Neste ano foram recebidas 97 propostas, número recorde na história do Programa, o que demonstra o crescente interesse por parte dos proprietários de terra na criação e implementação de RPPNs. Devido ao grande número e à qualidade das propostas recebidas, o processo de seleção foi um grande desafio”, explica Erika Guimarães, coordenadora da Aliança para a Conservação da Mata Atlântica e do Programa de Incentivo às RPPNs.

Os projetos selecionados neste edital abrangem os estados de Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, Bahia e Pernambuco, localizados nas regiões do Corredor da Serra do Mar, no Corredor Central da Mata Atlântica, no Corredor do Nordeste e na Ecorregião Florestas com Araucária. As propriedades contempladas no edital devem ampliar 4.500 hectares de área protegida por meio da criação das novas reservas e apoiar o plano de manejo de 2 mil hectares em RPPNs existentes na floresta mais ameaçada do país.

Proteção da biodiversidade

Os corredores são uma estratégia de conservação utilizada desde o início do programa para a proteção da biodiversidade em diferentes escalas, buscando a representação de diferentes ecossistemas, o manejo integrado da rede de unidades de conservação, contribuindo para manter ou incrementar a conectividade da paisagem. As estimativas indicam que, se adequadamente manejados, esses corredores podem, coletivamente, proteger 75% das espécies ameaçadas da Mata Atlântica.

De acordo com a coordenadora do Programa de Reservas Privadas da TNC, Giovana Baggio, os projetos de criação de RPPNs apoiados pelos Editais têm sido fundamentais para ampliar a área protegida em regiões prioritárias para a conservação. “O apoio dado aos projetos tem sido de grande valia, principalmente, por disseminar o conceito de conservação em toda a Mata Atlântica trazendo, desta forma, uma influência positiva para a região”, avalia.

Esta é a primeira vez que um edital apóia projetos de elaboração de plano de manejo, considerada uma importante ferramenta para a gestão e consolidação das reservas a longo prazo. “Hoje nenhuma RPPN na Mata Atlântica tem seu plano de manejo aprovado conforme o roteiro metodológico de 2004, os projetos apoiados nesse edital constituem um grande laboratório de planejamento para as reservas", destaca Monica Fonseca, especialista em áreas protegidas da CI-Brasil.

Conservação de espécies

O Programa já contribuiu para aumentar em quase 50% o número de RPPNs na Mata Atlântica, com recursos provenientes da TNC, Bradesco Cartões e Bradesco Capitalização. O tamanho médio das RPPNs é bastante reduzido nesse Bioma, já que mais da metade (54%) tem áreas menores que 100 hectares. Mas, juntas, as quase 500 RPPNs decretadas até 2007 no Bioma cobrem mais de 100 mil hectares.

As RPPNs são importantes também para proteger o entorno de unidades públicas como parques e reservas biológicas, reduzindo a pressão externa, além de contribuir para a conservação de inúmeras espécies ameaçadas de extinção da Mata Atlântica como o mico-leão-da-cara-dourada (Leontopithecus chrysomelas) e o papagio-chauá (Amazona rhodocoryta), entre outras.

A Aliança para a Conservação da Mata Atlântica nasceu em 1999, quando a Fundação SOS Mata Atlântica e a Conservação Internacional (CI-Brasil) firmaram essa parceria como forma de aumentar a escala e potencializar suas atuações a favor do bioma. Conheça os 39 projetos selecionados clicando aqui.

Da redação da EcoAgência, com SOS Mata Atlântica. Reprodução autorizada, citando-se a fonte.

Empresas de agrotóxicos tentam impedir reavaliações de produtos pela Anvisa com medidas judiciais

Várias ações judiciais de empresas que produzem ou comercializam agrotóxicos no país foram deflagradas contra a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), nos últimos meses. O objetivo é impedir o andamento da reavaliação de 99 produtos, iniciada em fevereiro, à base de 14 princípios ativos considerados prejudiciais à saúde humana: cyhexatina, acefato, lactofen, triclorfom, paration metílico, carbofuran, forato, endossulfan e paraquate, estes proibidos pela União Européia, mais glifosato, abamectina, metamidofós, fosmet e tiram.

As reavaliações podem resultar em restrições à aplicação do produto, exigência de mais segurança para o trabalhador e proibição total de uso do agrotóxico, diz o gerente geral de toxicologia da Anvisa, Luiz Cláudio Meirelles. Porém, duas ações dos fabricantes conseguiram êxito, até agora. Uma decisão judicial de abril, por ação impetrada pela empresa Arysta, proíbe publicar o resultado sobre o acefato, bem como aplicar qualquer restrição ou proibição aos produtos à base deste ingrediente ativo.

Cancelado nos Estados Unidos

Outra ação, do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Agrícola (Sindag), obteve liminar, dia 1º de julho, impedindo a Anvisa de aplicar qualquer restrição ou cancelamento aos produtos à base de tricloform, paration metílico, metamidofós, fosmet, carbofuran, forato, endossulfam, paraquate e tiram. Este último, segundo a Anvisa, sofreu tantas restrições de uso pela Usepa (Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos) que teve o registro cancelado voluntariamente pela empresa Taminco, a única que tinha o registro do produto naquele país.

A Anvisa ainda não recebeu o comunicado oficial da Justiça, ”mas a Agência tentará reverter a decisão (com recurso judicial) no prazo mais breve possível”, antecipa Meirelles. Atualmente, informa o órgão, existem 1.174 agrotóxicos registrados no país. O registro é concedido pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), porém, precisa antes passar por avaliações de impacto à saúde e ao meio ambiente elaborados pela Anvisa e Ibama, respectivamente.

Relatos de intoxicações

Uma reavaliação pode ser decidida em função de novos estudos científicos, alertas internacionais ou relatos de intoxicações que chegam às autoridades de saúde. Segundo o gerente de toxicologia, o programa de reavaliações da Anvisa prioriza ingredientes ativos com alta toxicidade aguda, que possam causar intoxicações, câncer, alterações hormonais e má-formação fetal, entre outros efeitos danosos à saúde humana.

Desde que as reavaliações começaram, em 2001, dois anos depois da criação da Anvisa, foram proibidos cinco ingredientes ativos (monocrotofós, heptacloro, lindane, pentaclorofenol, benomil), responsáveis pela fabricação de mais de 80 agrotóxicos, outros oito sofreram severas restrições de uso e 19 sofreram restrições menores. Saiba mais clicando aqui.

Por Ulisses A. Nenê, para a EcoAgência. Reprodução autorizada, citando-se a fonte.

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Feira Ecológica de Porto Alegre, convida clientes a trazerem suas sacolas

Neste sábado, 26 de julho, as bancas da Feira dos Agricultores Ecologistas de Porto Alegre deixam de entregar sacolas plásticas aos seus clientes. A ação faz parte da campanha Menos Plástico Mais Saúde, iniciada em 2006.

"Nossa feira se caracteriza por ser ecológica, por isso estimula práticas cotidianas relacionadas com a ecologia, tanto na produção dos alimentos limpos como no consumo consciente", afirma Glaci Campos Alves, engenheira agrônoma e uma das idealizadoras da feira. Segundo ela, campanhas para conscientizar os consumidores sobre os problemas causados pelo plástico na natureza e na saúde humana estiveram presentes ao longo dos 19 anos da FAE.

Problemas para a saúde

Segundo Eduardo de Oliveira da Silva, doutorando em química na UFRGS "o que prejudica a saúde são os componentes utilizados no processamento dos plásticos. Pesquisas já comprovaram que plastificantes como o DOP, dioctil fitalato, são cancerígenos e reduzem a fertilidade masculina".

Por sua eficiência e baixo custo, o DOP é utilizado em vários materiais, como copinhos de café ou chá. Quando os recipientes receberem o líquido aquecido liberam a substância cancerígena que ingenuamente é ingerida pelos ávidos por café ou chás.

Um extenso relato sobre substâncias contaminantes que acompanham as moléculas de plástico está no livro O futuro roubado, publicado em 1996, por Theo Colborn.

Poluição ambiental

Resultado da praticidade e do conforto, milhões de resíduos de sacolas e embalagens plásticas são descartadas a cada dia no planeta. De material fino e aparentemente assimilável pela natureza, uma sacola plástica pode levar centenas de anos para ser degradada.

"Os plásticos originam-se de substâncias naturais, os monômeros vindos do petróleo e, agora, do etanol", esclarece a química Karla Dall Alba. Ao sofrerem uma reação química chamada polimerização, os monômeros ligam-se uns aos outros formando uma substância resistente que une moléculas longas, chamada polímero.

Enquanto os polímeros naturais, como algodão, madeira, cabelos, látex, possuem organismos capazes de quebrar as suas moléculas, os polímeros sintéticos obtidos por reações químicas persistem no meio ambiente e chegam na cadeia alimentar. Aves, tartarugas e peixes morrem ao consumirem sacolas plásticas ou tampas de garrafas que chegam ao oceano levadas pelas águas poluídas nos rios.

Soluções enganosas

Algumas empresas apresentam novos tipos de plástico que podem desorientar os consumidores mal informados. As novas vedetes lançadas no mercado são os plásticos oxibiodegradáveis e o plástico verde.

Com o marketing de desaparecerem mais rápido, os plásticos oxibiodegradáveis apenas reduzem o tamanho dos polímeros. "Na sua composição são adicionados aditivos que facilitam o processo físico de oxidação", explica Camila Timm Wood, graduanda em biologia, que pesquisa a assimilação desse material pelos tatuzinhos, pequenos crustáceos que degradam materiais transformando-os em solo.

Segundo Wood, a molécula de plástico oxibiodegradável é quebrada em partes menores, menos visíveis, mas os pequenos pedaços continuam inteiros, como uma poluição invisível. "Sua decomposição é apenas física e não biológica. A curto prazo as enzimas de microorganismos não conseguem disponibilizar o carbono, o hidrogênio e o oxigênio a outros seres vivos".

As moléculas menores de plástico são consumidas pelo fitoplâncton que por sua vez servem de alimento aos peixes. "Existe a possibilidade de sermos plastificados ao longo da cadeia alimentar", alerta o ambientalista Jacques Saldanha. "Como o plástico não consegue ser digerido, ele vai alojar-se no corpo dos animas que cedo ou tarde servem de alimento para o ser humano, o qual também irá acumular partículas de plástico nas suas células e tecidos."

Plástico biodegradável

Outro material, ecologicamente correto, é o plástico biodegradável que pode ser obtido a partir de amido, como o da mandioca, ou de reservas energéticas produzidas por bactérias. "Eles são biodegrádaveis por serem capazes de transformar-se em água, gás carbônico, metano, compostos inorgânicos e biomassa". Wood comenta que universidades de São Paulo e Santa Catarina estão trabalhando na pesquisa e produção dessa matéria-prima.

O plástico verde apresenta os mesmos problemas de decomposição do tradicional, originado do petróleo. "Eles são quimicamente iguais, a diferença está na sua origem. Um provém da destilação do petróleo, o outro resulta do etanol que sofre processos químicos para ser desidratado até transformar-se em etileno", esclarece Silva.


Evento


Dia sem sacolas plásticas na Feira dos Agricultores Ecologistas
Dia: 26 de julho
Local: primeira quadra da Av. José Bonifácio, Porto Alegre, RS
Opção: banca de embalagens oferece sacolas de pano entre R$ 3,50 e R$ 23,00
Convidados: Ingá e Greenpeace para esclarecer dúvidas sobre o plástico

Mais informações: jornalista Cláudia Dreier: (51) 9819 9887

“As sementes do mal” serão debatidas nesta sexta-feira em Porto Alegre

Conciliar conhecimento científico com a experiência de vida dos agricultores é a maior motivação do pesquisador e escritor Antônio Inácio Andrioli, autor do livro "Transgênicos: as sementes do mal: a silenciosa contaminação de solos e alimentos". O livro será lançado em Porto Alegre, com debate, nesta sexta-feira, 25, às 17h, no Colégio de Aplicação do Campus do Vale da Ufrgs, no bairro Agronomia. A promoção é da Cooperativa de Produtores Ecológicos de Porto Alegre (Arcooiris) e Cooperativa Central dos Assentamentos do RS (Coceargs). No sábado, 26, às 9h, Andrioli autografa o livro na Feira dos Agricultores Ecologistas, na avenida José Bonifácio, bairro Bom Fim, ao lado da banca de livros (n°62), na segunda quadra.

O livro "Transgênicos: as sementes do mal: a silenciosa contaminação de solos e alimentos" é de autoria e organização do professor do Mestrado em Educação da Unijuí, Antônio Inácio Andrioli, doutor em Ciências Econômicas e Sociais pela Universidade de Osnabrück (Alemanha), e professor convidado do Instituto de Sociologia da Universidade Johannes-Kepler de Linz (Áustria), onde leciona Sociologia Política, Sociologia do Desenvolvimento e Metodologia da Pesquisa Social Empírica. A organização da obra teve o apoio de Richard Fuchs.

Ser filho de agricultor e ter atuado como técnico em agropecuária na extensão rural foi o que motivou Andrioli a escrever sobre transgênicos. “Sempre me identifiquei e preocupei com problemas dos agricultores”, observa, ao explicar que “o título `As sementes do mal´ é de um romance muito famoso na Alemanha, na década de 1960, cujo autor concedeu sua utilização para nosso livro, com a condição de que usássemos um subtítulo”. Ficou, portanto, "Transgênicos: as sementes do mal: a silenciosa contaminação de solos e alimentos".

Indicação a prêmio na Alemanha

Andrioli conta que, ao final de sua tese de doutorado, após cinco anos de estudos e pesquisa sobre soja transgênica (http://www.andrioli.com.br/livros/livro_biosoja.htm), houve uma proposta de edição de um livro, mas com uma linguagem mais acessível e dirigida a um público maior. “O mal da transgenia é que se trata de uma tecnologia "mal feita", que não deu certo, com enormes consequências negativas à saúde, ao meio ambiente e aos agricultores”, afirma o autor, ao lembrar que a redação e organização do livro demandaram outros dois anos.

Hoje o livro é o mais vendido na área de transgênicos no território de língua alemã, em países como Alemanha, Áustria, Suíça, Lichtenstein e Luxemburgo, e está sendo indicado ao Prêmio Sustentabilidade 2008 na Alemanha. Já como dificuldades, Andrioli destaca a língua alemã, a pressão das multinacionais, com preconceito em torno do título, e a falta de publicidade no Brasil por parte da grande imprensa.

Constatações científicas

Como conclusão, Andrioli analisa que os transgênicos são uma tecnologia de risco, “sem benefícios à maioria da população, com enormes efeitos destrutivos sobre o meio ambiente. Especialmente no caso do milho transgênico, além dos perigos já constatados, como alergias, resistências a antibióticos e destruição da biodiversidade, há um enorme risco envolvendo a saúde: foi constatado que cobaias em contato com a toxina produzida pelo Bacillus thuringiensis apresentaram sintomas de imunodeficiência”, destaca o autor.

Para ele, isso é extremamente alarmante e confirmaria os interesses das multinacionais que pressionam sua liberação, pois essas também são indústrias de medicamentos. “A liberação do cultivo desse milho foi realizada de maneira forçada, a partir dos interesses de poucas multinacionais, interessadas na cobrança de royalties (taxas sobre o uso dessa tecnologia apropriada em forma de patente). Essas multinacionais financiam institutos de pesquisa, cientistas, políticos e a própria imprensa. Os agricultores são enganados pelos mesmos argumentos propagados na época da introdução de agrotóxicos na agricultura e tendem a ser eliminados do processo produtivo, em função dos crescentes custos de produção. Isso tem sido amplamente verificado, mas ignorado tanto por organizações dos grandes como dos pequenos produtores rurais”, diz.

“É especialmente lastimável que muitas organizações e partidos políticos contrários a essa tecnologia tenham se silenciado ou mesmo modificado sua posição e que a sociedade civil brasileira, diferente de muitos outros países, esteja tão passiva diante de um escândalo político de tamanha envergadura”.

Como projetos "literários" ou de novas publicações, Andrioli cita seu novo projeto de pesquisa na Unijuí, com apoio do CNPq, que trata da tecnologia e agricultura familiar como uma relação de educação. “Além disso, meu pós-doutorado na Áustria aborda como a tecnologia agrícola pode servir de instrumento ideológico de dominação social”, finaliza, ao indicar seu site como fonte de consulta sobre seu currículo, livros publicados e projetos. (www.andrioli.com.br).


Por Adriane Bertoglio Rodrigues, para a EcoAgência. Reprodução autorizada, citando-se a fonte.

Ibama no RS externa preocupação quanto ao Zoneamento Ambiental da Silvicultura hoje vigente no Estado

O Zoneamento Ambiental para a Atividade da Silvicultura (ZAS) no Rio Grande do Sul, aprovado recentemente pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema), acaba de ser alvo de um manifesto da equipe técnica do Ibama que formou o Grupo de Trabalho Bioma Pampa e que condena a legislação em sua versão final.

O GT vinha defendendo a aplicação do Zoneamento originalmente proposto pela Fepam (Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler) e pela FZB (Fundação Zoobotânica do Estado) em seus critérios e diretrizes gerais. Mas, em seu manifesto, aponta que “a existência de espaços para discussão do Zoneamento (Consema, consultas públicas, etc.) contrastou com uma clara diretriz, por parte de determinados segmentos governamentais e não governamentais - majoritários no Conselho – de não se discutir ou aceitar no Zoneamento qualquer restrição objetiva ou mensurável que estabelecesse limites ambientais além daqueles já existentes no Código Florestal, fato que, por si só, já desqualifica por completo a utilização do conceito ‘Zoneamento’”.

Conforme o Grupo de Trabalho, a apreciação pelo Consema da proposta, em 9 de abril passado, foi um “processo tumultuado e controverso, sem a presença, na maior parte da reunião, das entidades favoráveis a uma versão mais restritiva de Zoneamento”. “Estas entidades, inconformadas com a forma de condução dos trabalhos pela presidência do Conselho e entendendo-se amparadas pela concessão de liminar que proibia a votação do Zoneamento naquele dia, retiraram-se da plenária; horas depois, já no período da noite, a liminar seria cassada pelo Governo do Estado e o Zoneamento votado e aprovado”, diz o manifesto.

O GT do Ibama avalia que a versão aprovada pelo Consema (Resolução n° 187/2008) “representa um documento sem eficácia, inócuo para garantir a conservação e uso sustentável do ambiente no Estado frente à grande expansão da silvicultura, notadamente na metade sul do estado, na área do Bioma Pampa”. E coloca que, para se configurar num instrumento eficaz para o planejamento da implantação da silvicultura no Rio Grande do Sul, o Zoneamento Ambiental deveria considerar, no mínimo, elementos tais como os índices de vulnerabilidade das Unidades de Paisagem Natural (UPN), percentuais de uso em cada UPN e os tamanhos e distâncias entre os maciços de árvores.

Esse foi um dos principais pontos defendidos por entidades gaúchas do terceiro setor. “Era fundamental que os plantios ficassem em forma de mosaico, para permitir corredores de biodiversidade e que não virasse um deserto verde”, disse a AmbienteBrasil Paulo Brack, professor doutor do Departamento de Botânica da UFRGS e membro da ONG Ingá (Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais). Segundo ele, a Secretaria de Meio Ambiente do Estado, no final do processo, eliminou os percentuais restritivos do Zoneamento e não quis discutir o tamanho máximo dos plantios, nem o distanciamento entre eles.

A Justiça determinou que a discussão volte ao Consema, para definir esses itens que não foram contemplados pela legislação. No dia dois passado, o juiz Almir Porto da Rocha Filho, da 4ª Vara da Fazenda Pública, decidiu que quatro regiões do Estado (ver descrição abaixo), definidas na proposta inicial do Zoneamento Ambiental para a Silvicultura como excluídas da possibilidade de terem plantações de eucaliptos, não poderão ter Licenças de Instalação ou de Operação expedidas pela Fepam até a nova análise do assunto pelo Conselho, sob pena de multa.

Secretário se manifesta no rádio
O secretário de Estado do Meio Ambiente, Carlos O. Brenner de Moraes, em entrevista ontem ao radialista Lasier Martins, na Rádio Gaúcha, disse que o manifesto dirigido à Sema demonstrou que o “Ibama é refratário ao Programa de Silvicultura do Estado do Rio Grande do Sul”. Também salientou que as queixas específicas de indefinição final quanto ao tamanho dos maciços e seu distanciamento não se justificavam, pois “a proposta [dos técnicos da FZB] iria engessar a atividade [de silvicultura]", já que colocaria "um mesmo padrão com as mesmas dimensões" para todas as unidades de paisagem. Afirmou ainda que os índices de vulnerabilidade eram subjetivos, com pesos “sem bases científicas”. Para finalizar, questionou o objetivo do manifesto, se teria “razão ambiental ou interesse ideológico?”

As áreas excluídas do licenciamento
As quatro áreas em que não é possível a Fepam emitir licenças de Instalação e de Operação são as descritas sob as identificações DP6, PC6, PL6 e PL8. A seguir, informações resumidas sobre cada área, retiradas do Zoneamento original pela assessoria de Imprensa do Tribunal de Justiça do Estado, como indicado na ação do Ministério Público:
DP6 – Com 72.640 hectares. É a região chamada Coxilha da Cruz, divisor de água e zona de nascentes das bacias do rio Jacuí e Santa Maria. A área apresenta potencial para Unidade de Conservação. Proteção de zonas de nascentes.
PC6 – Com 22.563 hectares. Barra do Quaraí e parte do Município de Uruguaiana. Vegetação de ocorrências restritas ao Estado. Ocorre o Espinilho (formação vegetal com espécies endêmicas do RS). Parte da área já é Parque Estadual;
PL6 – Com 95.659 hectares. Região da várzea do canal São Gonçalo, com a presença de banhados e campos inundáveis com diferentes fisionomias, que ligam a Lagoa dos Patos com a Lagoa Mirim.
PL8 – Com 55.557 hectares. Planície costeira entre a desembocadura da Laguna dos Patos e a Estação Ecológica do Taim, com banhados e campos litorâneos. Banhado do Maçarico, com presença de turfeiras. Bacia da Lagoa Mirim e Canal São Gonçalo e apresenta risco de déficit hídrico superficial.

Por Mônica Pinto / AmbienteBrasil

Anvisa vai monitorar teores de sal, açúcar e gordura trans nos alimentos

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já definiu 24 itens de produtos que passarão a ter monitoramento nos teores de sal, açúcar e de gordura trans. A informação é do ministro da Saúde, José Gomes Temporão, que terça-feira (22/07) reuniu-se com representantes do governo e da indústria em um fórum para debater problemas ligados à saúde da população.
Um dos consensos da reunião, realizada em Brasília, foi sobre a necessidade de se criar uma agenda de pautas entre os dois setores, no sentido de ser construírem pontos de consenso.

Ao final da reunião, o ministro foi enfático sobre a necessidade de que a questão seja tratada com seriedade. Ele justificou que todas as informações levantadas serão preciosas para que se possa ter uma avaliação técnica do teor atual de sal, açúcar e gordura trans nos alimentos. "Esses dados servirão como subsídios importantes a serem colocados na negociação com as indústrias", acrescentou o ministro.

José Gomes Temporão comemorou, também, o fato de que conforme dados das próprias indústrias, cerca de 20% de produtos do mercado já não usam gordura trans. "Isso é um bom sinal", destacou. "Existe espaço. Um percentual da população brasileira já exige esse tipo de produto e a nossa vontade é que em um prazo curto possamos estar com cem por cento dos alimentos comercializados no Brasil livres de gordura trans".

Também o presidente da Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação (Abia), Edmund Klotz, enfatizou a necessidade de se trabalhar para buscar alternativas viáveis, a fim de que sejam substituídos e, conseqüentemente, reduzidos os alimentos que prejudicam a saúde. Ele disse que a Abia já tem um pacto com a Organização Pan-Americana da Saúde para que, o mais rapidamente possível, a gordura trans seja substituída por outros ingredientes. Na avaliação de Edmund Klotz esses alimentos não podem parar de ser produzidos de uma hora para outra. É necessário que se encontrem alternativas para a substituição, complementou.

Pesquisa de Orçamento Familiar (POF), do Ministério da Saúde, revelou em 2003 que cerca de 38 milhões de brasileiros com mais de 20 anos estão acima do peso. O excesso de peso afeta 41,1% dos homens e 40% das mulheres, sendo que, desse grupo, a obesidade atinge 8,9% dos homens e 13,1% das mulheres adultas. De acordo com o mesmo estudo, o excesso de peso dos brasileiros está relacionado ao aumento do consumo de alimentos industrializados e também pela ingestão de grande quantidade de açúcar e gordura.

Por Juarez Tosi, para a EcoAgência. Reprodução autorizada, citando-se a fonte.

Greenpeace protesta contra licença ambiental para Angra 3

Ativistas do Greenpeace protestaram ontem (23) em frente ao Ministério do Meio Ambiente contra a concessão de licença ambiental prévia para a Usina Nuclear de Angra 3, no Rio de Janeiro, anunciada pelo ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, e pelo presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Roberto Messias.
Os manifestantes exibiam um quadro com a fotografia do presidente do Ibama identificado com o símbolo da radioatividade e com os dizeres “O Messias chegou e traz más notícias: Angra 3 aprovada”.

De acordo com o diretor da Campanha Energia do Greenpeace, Ricardo Baitelo, a opção pela retomada do programa nuclear não é a opção mais recomendada e ambientalmente viável para o país. “A [energia] nuclear é pior, tanto em custos quanto em relação a benefícios sociais, de criação de empregos, e principalmente em relação a poluição ambiental”, compara.

Baitelo acredita que a exigência de projeto para disposição final dos rejeitos radioativos entre as condicionantes não será cumprida. “Eles pedem que no início dos projetos, que se encaminhe essa questão, mas a gente sabe que isso não vai ser resolvido, porque simplesmente não há uma solução definitiva para os resíduos tóxicos no Brasil”.

De acordo com o Greenpeace, a “solução” que o governo exige da Eletronuclear para os resíduos de Angra 3 “vem apresentando problemas graves na Europa”, em países como França e Alemanha.

“O país não precisa de energia nuclear, existe um potencial enorme, só no Nordeste temos 10 Itaipus em eólica. O Brasil desperdiça milhões por ano com desperdício de energia. Se o país cumprisse as metas do Procel [Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica] poderia evitar a necessidade de se construir usinas nucleares”, defendeu.

Por Luana Lourenço, da Agência Brasil.

Licença ambiental impõe 60 exigências para obras de Angra 3

A licença ambiental prévia para a construção da usina nuclear Angra 3, no Rio de Janeiro, tem 60 exigências que a estatal Eletronuclear terá que cumprir antes de receber autorização para as obras. O documento foi assinado ontem (23) pelo presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Roberto Messias.

Ontem (22), o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, havia anunciado que as exigências seriam “brutais”. Entre as exigências condicionantes, está a solução definitiva do tratamento do lixo nuclear, a criação de um sistema independente de monitoramento dos níveis de radiação, a realização de obras de saneamento básico dos municípios de Angra dos Reis e Paraty e a gestão do Parque Ecológico da Serra da Bocaina.

O Ibama exige que o empreendedor deverá iniciar a execução do projeto para disposição final dos rejeitos radioativos de alta atividade antes do início da operação da Unidade 3. O monitoramento da radiação deverá ser feito por uma fundação universitária ou empresa independente da Eletronuclear. Em 90 dias deve ser apresentado ao Ibama o relatório do monitoramento sísmico efetuado na região.

A empresa responsável pela obra também deverá investir até o limite de R$ 50 milhões em saneamento das cidades de Angra dos Reis e Paraty, ambas no Rio de Janeiro, e adotar o Parque Nacional da Serra da Bocaina, localizado na divisa entre os estados do Rio de Janeiro e de São Paulo, e construir a Estrada Parque da Bocaina, no trecho Paraty-Cunha.

A licença ambiental prévia exige ainda realização de projeto de educação ambiental, prevendo atividades de conscientização, para acabar com a pesca de arrasto e propor novas atividades pesqueiras. Também deverá conscientizar a população sobre a importância dos ecossistemas de mangues, restingas e Mata Atlântica. Os conteúdos e as estratégias didático-pedagógicas do Programa de Educação Ambiental deverão ser detalhados pelo empreendedor.

A empresa ou consórcio responsável pela obra também deverá apresentar os resultados dos estudos técnicos desenvolvidos pela Fiocruz sobre possíveis efeitos de radiação, a longo prazo, na população do entorno do empreendimento. Os postos de saúde de Mambucaba e Cunhambebe deverão ser beneficiados por meio de convênios. A população das áreas de influência do empreendimento deverá ser assistida por programas de inserção social. E devem ser elaborados programas de ações direcionados às populações indígenas e quilombolas, com a participação de seus integrantes.

A usina nuclear de Angra 3 exigirá investimentos de R$ 7,3 bilhões e terá capacidade para gerar 1.350 megawatts.

Por Luana Lourenço, Agência Brasil

Especial: Plâncton ignorado

Há mais de 50 anos o plâncton do Atlântico Norte é monitorado periodicamente. Estudos baseados nesses dados têm mostrado que as mudanças climáticas globais estão afetando a distribuição das comunidades planctônicas, com conseqüências sobre toda a cadeia alimentar marinha e, portanto, sobre a pesca.

No Atlântico Sul, no entanto, a falta de longas séries históricas impede a realização de estudos que avaliem a dimensão desses impactos. O alerta foi feito pelo professor Jean Louis Valentin, do departamento de Biologia Marinha da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), na semana passada, durante a 60ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

“Observamos muitos fenômenos que podem estar sendo causados pelo efeito das mudanças climáticas sobre o plâncton, que é a base da cadeia alimentar marinha e fonte essencial dos recursos pesqueiros. Mas não podemos tirar conclusão alguma porque não temos séries temporais longas. Recomendo fortemente um monitoramento sistemático do plâncton”, disse Valentin à Agência FAPESP.

De acordo com Valentin, o declínio da produção de sardinha na região de Cabo Frio, no litoral fluminense, é um exemplo de fenômeno que pode estar sendo causado por impactos do clima sobre o plâncton.

“A sardinha só existe ali por causa do fenômeno da ressurgência, que é um afloramento das águas do fundo, ricas em nutrientes. Isso faz crescer o plâncton, que é o único alimento da sardinha. O aumento da temperatura torna a água menos densa, provocando uma estratificação da coluna d’água, diminuindo a ressurgência”, explicou Valentin.

Segundo o professor, outros fenômenos ocasionados pelas mudanças climáticas podem estar também afetando as comunidades plantônicas na região do estuário do Rio da Prata. “Com o aquecimento, há uma maior descarga de água continental, que altera a composição do plâncton. Isso tem diversos efeitos sobre a cadeia alimentar oceânica, podendo levar ao aparecimento de espécies exóticas e tóxicas”, disse.

Nenhuma conclusão poderá ser tirada, no entanto, enquanto não houver um monitoramento contínuo do plâncton. “Não podemos saber se essas alterações estão relacionadas às mudanças climáticas, pois no Atlântico Sul não há coleta contínua de dados por mais que um ou dois anos. Precisaríamos de séries de 40 a 50 anos”, disse Valentin.

O aquecimento global, de acordo com o professor, causa o deslocamento de comunidades planctônicas, levando espécies de águas frias a desaparecer, enquanto as de áreas quentes ocupam novas regiões. “Essa substituição de populações, que muda todas as relações tróficas, tem sido observada no hemisfério norte”, disse.

Segundo o cientista, como há necessidade de várias décadas de monitoramento sistemático, é preciso que ele comece a ser feito imediatamente. Para ele, isso poderia ser feito a partir de pontos de coleta próximos a laboratórios distribuídos pela costa brasileira.

“Bastaria uma coleta semanal. O custo não passaria de R$ 30 mil, incluindo o financiamento de bolsas de mestrado e o aluguel de barcos. É irrisório para um benefício tão grande”, disse.
Um orçamento maior permitiria, segundo ele, adquirir um CPR (Continuous Plankton Recorder) – o aparelho utilizado para recolher de amostras desde 1958 no Atlântico Norte. “O ideal seria também investir em bolsas para taxonomistas, ampliar os programas já existentes e melhorar métodos de coleta e processamento das amostras”, declarou.

O pesquisador lembra que há projetos de excelência atuando no país, como o Projeto Laplata – que estuda os mecanismos físicos que influenciam o processo biológico nos oceanos – e o Programa Goos Brasil, componente brasileiro do Sistema Global de Observação dos Oceanos (Goos). Mas nenhum deles faz coleta de plâncton.

“No Atlântico Norte temos uma realidade diferente. Quando consultamos a base de dados global do governo norte-americano sobre plâncton, vemos claramente que estamos carentes de informação sobre o Atlântico Sul”, disse o cientista, referindo-se à Base de dados de observação, produção e ecologia de plâncton costeiro e oceânico (Copepod, na sigla em inglês).

Por Fábio de Castro, da Agência Fapesp.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Ignorância e má-fé: um jogo de sete erros

Por Rogério Grassetto Teixeira da Cunha*

Foi publicado recentemente na Folha de São Paulo um artigo de autoria do físico Rogério Cezar de Cerqueira Leite, que também é membro do Conselho Editorial do jornal, sobre implicações ambientais relacionadas à produção de alimentos e biocombustíveis. O artigo tenta demonstrar ainda que os ambientalistas (seja da ala dos "ecoidiotas transnacionais" ou dos "verdolengos com e sem colete", como ele nos classifica), com suas críticas ao etanol, estariam agindo por ignorância e/ou má-fé. Ele parte do princípio de que estaríamos atribuindo ao aumento da produção de etanol da cana-de-açúcar o risco de competição com a produção de alimentos.

Este é um exemplo claro de falácia "homem-de-palha", que consiste em atribuir ao oponente um argumento fraco ou facilmente atacável, apesar de nunca ter sido realmente proferido ou defendido tal como se coloca. Assim, torna-se mais fácil o combate e a desmoralização do oponente. Apesar de haver pessoas que tenham utilizado o argumento da competição, está claro para boa parte dos ambientalistas que a alta nos preços dos alimentos é resultado de uma série de fatores complexos, em grande parte independentes do etanol.

Temos, sim, um enorme rol de críticas à monocultura de cana: trabalho em condições degradantes ou escravo, esgotamento do solo, mau controle do vinhoto, uso extensivo de queimadas, intimidação de comunidades locais no Nordeste, uso exagerado de agrotóxicos. Mas, sabemos que, pensando todo o Brasil, a cana-de-açúcar não compete globalmente com a produção de alimentos.

Isto posto, pode haver alguma competição em nível local. Áreas de cana são monoculturas extensas, monótonas, e muitas vezes ocupam áreas de antigos sítios responsáveis por uma rica e diversificada produção de alimentos consumidos localmente. Com o seu fim, o preço de legumes, hortaliças e algumas frutas pode vir a aumentar.

O acadêmico parece ter gostado da falácia, tanto que a usa mais uma vez ao acusar a "mente mórbida" dos "ecofestivos brasileiros" de outro argumento: de que "a expansão da cultura da cana-de-açúcar estaria impelindo a soja para o norte, que, por sua vez, estaria empurrando o gado, que, como conseqüência, estaria invadindo a floresta amazônica". Ele argumenta que, mesmo se dobrássemos a área plantada com cana, isto teria um impacto muito pequeno sobre a pecuária (que ocupa uma área trinta vezes maior) e que, portanto, não seria um motor para a expansão da mesma.

Sabemos muito bem que o raciocínio criticado realmente não corresponde à realidade e que o desmatamento na Amazônia tem mais a ver com um ciclo de madeira e pecuária, com contribuição da soja. Porém, as expansões da cana e do desmatamento podem estar relacionadas devido a mecanismos mais complexos.

Com a venda ou o arrendamento de terras nos locais de expansão da cana-de-açúcar (São Paulo, Mato Grosso do Sul, Paraná, Minas Gerais e Goiás), os fazendeiros podem mudar-se para a Amazônia. Como a terra por aqui é muito mais cara que lá, eles podem comprar uma área muito maior, para então aplicar os tradicionais métodos de pecuária ou agricultura na Amazônia.

Tememos ainda que a cultura da cana-de-açúcar venha a ampliar-se na própria região e somar esforços com as outras forças destruidoras. O artigo prossegue com uma série de cálculos bastante simplórios, que reduzem o complexo debate a meia dúzia de dados, para concluir que uma área plantada de 800 milhões de hectares seria suficiente para alimentar toda a humanidade.

Com mais 300 a 400 milhões, diz ele, poderíamos ainda abastecer o mundo com etanol suficiente para substituir totalmente os combustíveis fósseis. Citando a FAO, diz que atualmente são cultivados 1,5 bilhão de hectares e que haveria mais 3,5 bilhões disponíveis. Disto tudo, ele conclui não ser necessário "ampliar a área cultivada para suprir a humanidade de toda a comida e energia de que precisa hoje e precisará no futuro, mesmo que o consumo de energia dobre e a população do globo atinja o limite superior".

Aqui, todo seu raciocínio parece um "jogo dos sete erros" (propositais?):

1. Usar como base um consumo per capita de 2.000 kcal/dia, quando ele já está por volta de 2.800 kcal/dia e também tende a crescer com o aumento de renda mundial.

2. Considerar na análise somente a área de grãos necessária para a produção de carne. Apesar de válido para a produção industrial de frango, porcos e gado confinado, tal raciocínio não vale para todos os casos. Em diversos países, os animais são criados no pasto, com produtividade bem mais baixa. Num cálculo rudimentar, a produtividade média de carne bovina no Brasil é de aproximadamente 45 kg por hectare/ano.

3. Omitir da análise a perda anual de terras agricultáveis, bem como os impactos negativos que o aquecimento global terá sobre a produtividade agrícola. Combinados, estes três "erros retóricos" aumentariam sobremaneira as estimativas de Cerqueira Leite sobre a área do planeta necessária à produção de alimentos. Evidentemente, tirando para isso espaço das florestas e savanas naturais. Na verdade, ele confunde o leitor com sua dança de números, pois "esquece" de mencionar que a mesma FAO soma, à área de 1,5 bilhões de hectares plantados, cerca de 3,5 bilhões de área de pastagens. Portanto, já temos 5 bilhões de hectares alterados.

4. Assumir, para chegar às suas conclusões, altas produtividades no campo. Utilizar tais valores para todas as terras cultiváveis, estejam onde estiverem, é um grave equívoco, pois variações de solo, precipitação, incidência de sol, entre outras, impedem que os índices sejam obtidos em todos os locais. Assumir tal pressuposto significa abrir mão de vez da agricultura de pequenas propriedades e familiar (socialmente muito mais justificáveis e as grandes geradoras de empregos no campo), para focar apenas no modelo de enormes monoculturas mecanizadas e intensivas em insumos (adubos e agrotóxicos), modelo que, a longo prazo, tende a não ser sustentável. Isto leva a mais expulsão de pessoas do campo (com as conseqüências conhecidas), pois esta modalidade é muito menos intensiva em mão-de-obra.

5. A lógica da produção e do consumo de alimentos no mundo não se resume às simples contas apresentadas. Atualmente, já produzimos alimentos em quantidade suficiente para alimentar a todos de forma razoável. Mas ele sabe muito bem (ou pelo menos deveria saber) que as desigualdades sociais e econômicas impedem o acesso justo. E não há perspectivas no curto prazo de solução deste problema. As soluções que ele propõe baseiam-se justamente na premissa que gera a situação atual: enxergar a produção de alimentos sob uma ótica exclusivamente economicista e a produção de biocombustíveis para manter o atual modelo de sociedade. Ou seja, ele sugere dar mais veneno ao doente. Quinto erro. E dos crassos.

6. Ao considerar a produção de alimentos como uma simples conta global de produção e consumo, ele "esqueceu-se" de que há diferenças populacionais entre países, e que alguns são importadores líquidos de alimentos, enquanto outros (Brasil, por exemplo), são exportadores. Omitiu ainda que, por possuirmos características naturais e sociais favoráveis, nos está reservado pela estrutura de poder mundial cada vez mais o papel de celeiro, pasto e bomba de combustível do mundo. Isto é grave do ponto de vista ambiental, pois significa a destruição de mais ambientes naturais.

7. Desconsiderar que as decisões sobre como, onde e o quê plantar e criar não são tomadas levando-se em conta aspectos ambientais ou de suprimento de alimentos à população. O lucro, de preferência o mais rápido possível, e a produtividade são os principais guias. Somado ao beneplácito implícito (ou explícito) dos governos e à falta de fiscalização, o resultado é conhecido: desmatamento e degradação ambiental crescentes. Ligado a isto está o fato dele considerar as possíveis terras cultiváveis adicionais (os tais 3,5 bilhões de hectares) exclusivamente sob a ótica humana. É o planeta Terra servindo apenas a uma espécie, a nossa, esquecendo-se que as terras não estão lá, esperando para ser plantadas. Na verdade, uma parte desta área são ecossistemas naturais que, no entanto, realizam uma série de serviços à humanidade, e à própria agricultura inclusive.

Os seus argumentos, da forma como foram colocados, soam como música para o setor ruralista brasileiro, para as grandes agroindústrias (cada vez menos nacionais) e, de quebra, para todos aqueles que consideram os ambientalistas como entraves ao desenvolvimento. Seria o caso de perguntar: qual a intenção do eminente cientista com um texto tão cheio de equívocos?

*Artigo publicado no Correio da Cidadania. Rogério Grassetto Teixeira da Cunha, biólogo, é doutor em Comportamento Animal pela Universidade de Saint Andrews. E-mail: rogcunha@hotmail.com

terça-feira, 22 de julho de 2008

Entidades enviam manifesto a senadores contra mineração no Guaíba

Com a liberação pela Fepam da mineração no Lago Guaíba, a Agapan e outras quatro entidades enviaram manifestação de repúdio aos senadores gaúchos Paulo Paim, Pedro Simon e Sérgio Zambiasi. Os ambientalistas classificam a permissão “criminosa e desumana”. Para a presidente da Agapan, Edi Fonseca, a liberação viola o Código Estadual do Meio Ambiente, “sem necessidade, pois no RS mais de 90% da areia estão em áreas de menos impacto ambiental, e não em rios e lagos”, lamenta.

De acordo com o Código, o art. 212 define que “a atividade de mineração não poderá ser desenvolvida nos acidentes topográficos de valor ambiental, paisagístico, histórico, cultural, estético e turístico, assim definidos pelos órgãos competentes”.

O documento enviado aos senadores critica a atuação da Fepam. “Enquanto o mundo se preocupa com o abastecimento de água e com a proteção de suas reservas naturais no Sul do Brasil, para constrangimento dos gaúchos, a Fepam, um órgão atualmente desestruturado e desacreditado, através de seus diretores, desafia essa realidade. O Guaíba é de um valor inestimável para a população de Porto Alegre. Paradoxalmente, enquanto a Prefeitura da capital investe somas astronômicas para a sua recuperação, o órgão estadual que mais deveria zelar pelo Lago, o entrega a uma das atividades mais poluidoras e sem controle existente”, expressa o texto.

As entidades sugerem aos senadores que interfiram junto ao ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, e à governadora Yeda Crusius para que determinem à Fepam o cumprimento da lei, decretando o Lago Guaíba como Área de Preservação Permanente. Além da Agapan, assinam o manifesto o Centro Comunitário de Desenvolvimento da Tristeza, Pedra Redonda e Vilas Conceição e Assunção; a ONG Mar de Dentro; O Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (Ingá); e a Associação de Moradores do Sétimo Céu.

A partir da publicação desta matéria, a Assessoria de Imprensa da Fepam nos contatou para afirmar que "a Fepam não autorizou e não pretende autorizar a retirada de areia do Lago Guaíba".


Por Adriane Bertoglio Rodrigues, da EcoAgência. Reprodução autorizada, citando-se a fonte.

Texto reeditado em 27 de julho.

SOS Mata Atlântica lança Plataforma Ambiental no Rio de Janeiro

A SOS Mata Atlântica lança, nesta quarta-feira (23/07), em parceria com a Frente Parlamentar Ambientalista, a Associação Nacional de Órgãos Municipais de Meio Ambiente (Anamma), o Instituto Brasileiro de Administração Municipal (IBAM) e a Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS), a Plataforma Ambiental aos governos locais, candidatos a prefeito e vereadores municipais.

O objetivo da Plataforma Ambiental é fornecer instrumentos para o cidadão nas Eleições Municipais de 2008 na busca do compromisso dos candidatos com uma Agenda Socioambiental, num universo de 3.406 municípios brasileiros abrangidos pelo Bioma Mata Atlântica e que podem ser conferidos no Atlas dos Municípios da Mata Atlântica, disponível no portal www.sosma.org.br.

Entre os princípios que a Plataforma reforça estão o meio ambiente como bem de uso comum do povo, a priorização do interesse público, o acesso à informação, a participação da população e a compatibilidade com ações de âmbito econômico, social, de saúde, educacional e cultural. Baseado em três eixos estruturais: Desenvolvimento Sustentável, Educação e Saúde, e Saneamento Ambiental, o documento dá subsídios à população para que se cobre a importância dos municípios para a conservação ambiental.

Políticas Municipais

O documento propõe a adoção, em cada município, de uma Agenda Institucional, que possibilite a implementação de sistemas municipais de gestão do meio ambiente, ao mesmo tempo em que convoca o Legislativo dos municípios para a discussão de instrumentos legais referentes a políticas ambientais municipais.

Também propõe uma Agenda da Cidadania, que promova a mobilização social e gestão participativa, com o uso de ferramentas como a Agenda 21 Local ou Educação Ambiental, entre outras. E a criação de incentivos como o IPTU Verde e a Agenda Temática, que englobe assuntos como a gestão de Águas e Florestas, Uso e Ocupação do Solo, Áreas Verdes, Resíduos Sólidos, Turismo Sustentável e Agricultura Sustentável.

Atenção Especial

O lançamento acontece nesta quarta-feira, às 11h, no Instituto Brasileiro de Administração Municipal, no largo do IBAM, s/n – Humaitá, Rio de Janeiro. “Devido à diversidade de um bioma como a Mata Atlântica e um país tão grande como o nosso, é imprescindível uma atenção especial ao meio ambiente nas eleições municipais deste ano. É o momento de cobrar atitudes concretas pela conservação desta floresta, onde vivem mais de 120 milhões de pessoas”, explica Mario Mantovani, diretor de mobilização da SOS Mata Atlântica e coordenador da Plataforma Ambiental.

Além do Rio de Janeiro, a Plataforma Ambiental 2008 foi lançada na Câmara dos Deputados, em Brasília, no dia 16 de julho e está prevista para acontecer em outras cidades e capitais dos estados da Mata Atlântica, como Salvador, Fortaleza, Recife, Porto Alegre, Presidente Prudente, São Paulo, Londrina, Curitiba e Belo Horizonte, até setembro, envolvendo candidatos, partidos e organizações da sociedade civil.

Redação da EcoAgência, com informações da assessoria de imprensa.

Apenas 30% das pesquisas sobre a Amazônia são produzidas no Brasil

Por Clarissa Pont*

Apenas 30% das pesquisas sobre a Amazônia têm a participação de pelo menos um pesquisador com residência no Brasil. O dado foi apresentado durante a Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) por Adalberto Luís Val, do Instituto de Pesquisas da Amazônia (Inpa). “Se soberania hoje é informação, esse é o tamanho da soberania que temos sobre a região. Temos que fixar recursos humanos na Amazônia, o que vai proporcionar a retaguarda para uma ação na Amazônia confiável, justa, sustentável, que é o que precisamos”, disse o pesquisador.

A necessidade urgente de aumentar a quantidade de doutores nas universidades dos estados que abrangem a floresta foi tema constante durante a reunião da SBPC, com um forte consenso de que essa é uma questão estratégica para o desenvolvimento do país.

Na mesma direção da avaliação feita pela senadora Marina Silva, Val acredita que, com pequeno aumento do percentual dos investimentos para ciência e tecnologia, é possível formar pelos menos 2,1 mil novos doutores na região até 2011 e expandir o número de universidades e centros de pesquisa na Amazônia. “A Amazônia ocupa quase 60% do território brasileiro e responde por 7,8% do Produto Interno Bruto do país. Mesmo assim, os recursos em ciência e tecnologia para a região são apenas 2% do total nacional. A Amazônia é uma questão nacional, não pode ser tratada isolada do desenvolvimento do país como um todo”, argumentou.

Val esteve em Campinas para participar da sessão especial da Comissão da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional da Câmara dos Deputados, atividade da 60ª Reunião anual da SBPC. Durante o encontro, deputados e cientistas assumiram o compromisso de somar esforços para dobrar, no prazo de três anos, o número de doutores na região, passando dos atuais 3.500 para 7.000. Para o presidente da SBPC, Marco Antonio Raupp, que participou da sessão, a ciência precisa ser transformada no motor do desenvolvimento da Amazônia. Somente com a ampliação dos pesquisadores e, conseqüentemente, do número de estudos relacionados à biodiversidade da Amazônia, é possível gerar riquezas na região, de forma sustentável e solidária.

Outro número que chamou atenção da Comissão da Amazônia é que, dentro do percentual de pesquisa desenvolvida no Brasil sobre a Amazônia, apenas 9% são desenvolvidas por organismos amazônicos.

Fundo para a Amazônia

Enquanto os debates sobre a floresta aconteciam no campus da Unicamp, o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, informou que o governo quer arrecadar um total de US$ 900 milhões no primeiro ano de funcionamento do fundo que será criado para preservar a Amazônia. No dia 16 de julho, Minc informou que o fundo será criado por decreto no dia 1º de agosto deste ano. Segundo ele, a primeira doação ao fundo, de US$ 100 milhões, será da Noruega. No entanto, o ministro assegurou que as contribuições de países estrangeiros ao fundo não representam ameaça à soberania do Brasil. "O fundo será regido por um conselho no qual os doadores não terão assento. Será um fundo soberano", garantiu.

* Agência Carta Maior, com informações da Agência Brasil e SBPC.

segunda-feira, 21 de julho de 2008

EcoAgência retoma o noticiário diário

"O que não me mata, me fortalece" - Nietzsche

Voltamos hoje à produção diária de notícias da EcoAgência, que serão publicadas neste blog até ficar pronto, em breve, o nosso novo portal. Como divulgamos amplamente, fomos tirados do ar dia 10 de junho por um ataque de hackers que vinha acocntecendo desde o dia 10 de maio, quando foi percebido pela primeira vez. Eles se tornaram diários até o ponto de inutilizarem o antigo site. A Polícia Federal e o Ministério da Justiça foram notificados e o caso se encontra sob investigação policial. A diretoria do Núcleo de Ecojornalistas do Rio Grande do Sul – NEJ/RS, responsável pela EcoAgência, classifica este como um dos mais graves atentados à liberdade de imprensa e ao direito à informação ocorrido no país, nos últimos anos. Mas longe de esmorecer, isso nos faz aproveitar este momento para avaliarmos e qualificarmos nosso trabalho. Contem conosco, como sempre.

Os Editores

Muita polêmica no seminário sobre as propostas de diminuição da faixa de fronteira



Porto Alegre, RS – “Não vou ter papas na língua, este é um debate entre uma proposta nacionalista e uma proposta entreguista”, disse hoje pela manhã o professor de Direito Constitucional Eduardo Carrion, durante o Seminário sobre Faixa de Fronteira, na Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul. Num ambiente tenso e por vezes acalorado, foram discutidas as proposições em tramitação no Congresso Nacional sobre a mudança da extensão das faixas de fronteira no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso do Sul. As intervenções dos convidados mostraram que o assunto é mais polêmico do que se imagina, com interesses muito fortes em jogo.

A discussão foi despertada pela atuação das indústrias papeleiras, que estão adquirindo terras para plantio de eucalipto inclusive nos limites do Rio Grande do Sul com os países vizinhos, principalmente a sueco/finlandesa Stora Enso. Uma Proposta de Emenda Constitucional do senador Sérgio Zambiasi (PTB/RS), a PEC 49/2006, propõe a redução das faixas de fronteira de 150 quilômetros para 50 quilômetros. No mesmo sentido, também estão tramitando a PEC 235/2008, de autoria do deputado federal Mendes Ribeiro Filho (PMDB/RS) e o Projeto de Lei nº 2275/07, de autoria do deputado Matteo Chiarelli (DEM/RS).

Segundo o deputado federal Vieira da Cunha (PDT/RS), relator do PL de Chiarelli, “muitos prefeitos estão inconformados com a legislação, por impedir a atração de empreendimentos (estrangeiros) em suas regiões, e defendem que a redução da Faixa seja fixada em 10 quilômetros da fronteira”. “O tamanho da Faixa é indiferente do ponto de vista jurídico. Ou criamos um Marco Regulatório, que dê segurança jurídica ao empresário brasileiro, ou vamos trabalhar gerando insegurança jurídica”, observou Zambiasi, de branco na foto, durante o seminário promovido pela Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados.

Estavam presentes na sessão, presidida pelo deputado federal Adão Pretto (PT/RS) ,representações de cerca de 40 entidades, associações e movimentos ambientais, sociais, jurídicos e estudantis do Estado, ultrapassando um público de 250 pessoas no Plenarinho da Assembléia Legislativa, incluindo autoridades e deputados estaduais e federais, prefeitos e vereadores.

O encontro iniciou com o senador Sérgio Zambiasi apresentando dados do Incra referentes à Faixa de Fronteira, que é de 15.700 quilômetros de extensão, passando por 11 países e 10 estados. “No RS, (a faixa de fronteira) representa 49,99% do território”, disse Zambiasi. A diminuição dessa área, como querem as propostas dos parlamentares, reduziria as restrições de compra e uso de terras por estrangeiros, definidas pela Lei Federal 5.079/71, em seu artigo 12º, através da alteração da Lei Federal 6.634/79, que estabelece as restrições para compra de terras nas zonas de fronteira.

Ministério da Defesa

Representando a Secretaria de Política Estratégica e Assessoria Internacional do Ministério da Defesa, o coronel Gustavo de Souza Abreu disse que o Rio Grande do Sul é o primeiro Estado onde isso está sendo tão fortemente debatido. Ele citou estudos sobre o tema e afirmou que a redução da Faixa de Fronteira não assegura desenvolvimento para algumas regiões e pode ainda gerar tensões políticas em outros estados. “O ministro Nelson Jobim é simpático à revisão da legislação, mas nós, do Ministério da Defesa, não queremos mexer nos 150 quilômetros”, disse o coronel.

“Vou esclarecer ao coronel que o ambiente é acalorado, democrático, mas que há uma razão pontual: é porque não temos uma política para o meio ambiental no Rio Grande do Sul, não existe política ambiental, existe uma política industrial, tenho dúvidas até se existe um governo legítimo”, afirmou o professor Eduardo Carrion na sua intervenção. Ex-diretor da Faculdade de Direito da Ufrgs, ele observou que a relativização ou diminuição das fronteiras é muito conveniente para os países dominantes e suas empresas, não para países periféricos e com muitas riquezas a proteger, como o Brasil. “Essa PEC não tem sentido”, arrematou, depois de afirmar de que se trata de uma disputa entre “nacionalistas e entreguistas”.

Faixa no Uruguai

Após os depoimentos do botânico Ludwig Buckup e do químico, geneticista e ambientalista Flávio Lewgoy, contrários à redução da fronteira e críticos aos projetos das papeleiras, houve o depoimento da ambientalista uruguaia Maria Selva, representante da Rede Núcleo Amigos da Terra do Uruguai. Ao contrário do Brasil, onde há proposta para diminuição – e há quem peça a extinção – da faixa de fronteira, lá o governo de Tabaré Vasquez apresentou projeto, recentemente, em sentido contrário, criando uma zona de fronteira de 50 quilômetros onde serão proibidas as aquisições de terras por estrangeiros.

“Pode parecer pouco, mas para onde não tem nada já é muito”, disse Maria Selva, esclarecendo que hoje não há nenhuma faixa de fronteira prevista em lei no seu país. Estima-se que hoje 36% do território uruguaio já esteja em mãos estrangeiras, relatou, e somente nos últimos cinco anos 25% das terras produtivas trocaram de mãos, sendo que 75% desse percentual correspondem a pequenos produtores familiares que se desfizeram de suas terras, pressionados pelo agronegócio da soja e papeleiras, principalmente. “A concentração de terras nas mãos do agronegócio e de estrangeiros é um problema muito grave no meu país”, acrescentou.

"O professor Carrion não é mais patriota e não é mais nacionalista que eu", afirmou o senador Sérgio Zambiasi, ao se despedir, antes do encerramento. Ele disse à EcoAgência que é impossível a sua PEC ser votada este ano. Para ser aprovada, teria que ser votada duas vezes no plenário do Senado e bastaria a apresentação de uma emenda para voltar à Comissão de Constituição e Justiça, por onde já passou, começando toda a tramitação novamente. E ainda teria, depois, que ir à Câmara dos Deputados. “Isso é coisa para daqui a cinco ou dez anos”, admitiu. Ele reclamou que até ser aprovada pela CCJ ninguém das entidades presentes no seminário se manifestou sobre a proposta.

Carta das Entidades


Na abertura do Seminário, o recém criado Movimento Gaúcho em Defesa do Meio Ambiente, representando cerca de dez entidades e ONGs, lançou a Carta pela Manutenção da Faixa de Fronteira. Segundo o documento, a legislação atual não impede investimentos estrangeiros, apenas limita a uma mesma nacionalidade a propriedade de aproximadamente 10% da área de um município e 25% aos estrangeiros no total. As entidades afirmam também que as empresas do setor da celulose querem o domínio territorial para a ampliação das monoculturas arbóreas, sem considerar os seus impactos sócio-ambientais.

Para os ambientalistas, o projeto de redução da Faixa de Fronteira favoreceria de forma direta a empresa sueco-finlandesa Stora Enso, que, de acordo com o Ministério Público Federal, já adquiriu terras de forma irregular na região fronteiriça, através de outras empresas nacionais, o que gerou o Inquérito Civil número 158/2005. Além disso, alertam, a região da chamada Faixa de Fronteira Sul-Brasileira compreende grande parte do Bioma Pampa e o Aqüífero Guarani, uma das maiores reservas hídricas do mundo.


Por Adriane Bertoglio Rodrigues e Ulisses A. Nenê adriane@ecoagencia.com.br
ulisses@ecoagencia.com.br

Foto: Kátia Marko